17 de março de 2009

Perspectiva

Outro post que ficou estagnado por meses...

Há uns dois anos, numa conversa de fim de dia, um colega me pediu para resumir minha filosofia de trabalho (que ele conhecia de acompanhar meu sistema de comportamento obsessivo no dia a dia) pra um rapaz bem mais novo que nós, recém saído da faculdade. Eu disse algo nas linhas de:

Em qualquer situação, eu espero que o pior aconteça, me preparo pro pior, imagino qual deve ser minha reação no caso (bastante provável) do pior acontecer, e planejo detalhes da reação que devo ter nas pequenas variações admissíveis do pior acontecimento. Aí, quando o pior acontece eu estou preparado, e se o pior não acontece - o que é raro - eu fico menos deprimido e até levemente satisfeito.
A reação do rapaz foi meio chocante pra mim...

Ele disse: "Isso é horrível!" com uma expressão de pena tão visível que até senti uma ponta de preocupação pelo MEU estado mental.

Mas o tempo passou e eu não pensei mais nisso. Até que há uns dois dias (nota: comecei a escrever este post em Dezembro...) um colega de Wisconsin - um dos caras mais inteligentes com quem já trabalhei e por quem eu tenho o maior respeito profissional e pessoal - passou por aqui pra nos visitar e durante a conversa disse algo como:
Eu expliquei para [o interlocutor da história] que com você reclamar não era nem tanto um objetivo, mas a maneira de você se expressar sobre quase tudo.
Eu não deixei transparecer, mas o comentário dele fez uma imediata conexão com a reação do rapaz da história original. Parece que não só eu sou um pessimista digno de pena, mas um reclamador profissional.

O fato é que sou pragmático demais pra ser otimista. Esperar o melhor, acreditar na (ou pior, depender da) sorte, viver esperando que o amanhã vai ser melhor não combina com a característica prática que define, em grande parte, a minha personalidade. Qualquer pessoa prática prefere estar preparada, e preparação exige esse exercício de "what if?" e essa habilidade de imaginar desfechos negativos.

Esse traço de personalidade somado ao fato de que, no fundo, nossa profissão é a de encontrar ineficiências e projetar soluções em software para redimí-las, certamente deixa muito vivo no dia a dia as mazelas da profissão - colegas despreparados, software pré-existente mal pensado ou defasado, chefes e colegas que não entendem o que nós fazemos, constante necessidade de atualização profissional beirando a histeria, ferramentas de trabalho problemáticas ou hiper-complexas, etc. Será anormal ter uma visão crítica e até negativa de uma profissão quando realmente a conhecemos a fundo? Será estranho reclamar quando a experiência profissional se acumula a ponto de que nada mais é efetivamente novo?

Além de tudo, aqui nos EUA muito da minha personalidade normal acaba sacudida pelo quebra-molas mental (por menor que seja hoje em dia, e não é tão pequeno assim) que é a segunda língua. Sem contar que determinados comportamentos, que no Brasil definem o caráter de uma pessoa, são inaceitáveis aqui.

É possível que minha experiência de vida, e esses limites mentais e sociais afetem a imagem que eu projeto mais do que imaginava.

E é possível - não, é certo - que eu simplesmente deixe muito a flor da pele as minhas frustrações.

A solução ideal para frustrações é simples - não as tenha. Trace objetivos realistas e alcançáveis. Se o objetivo depende só de você e nada mais, não há frustração envolvida. Como é quase impossível ter objetivos que dependam somente de nós (sem contato com outras pessoas ou ferramentas que possam interromper ou atrasar o alcance do objetivo em questão), é quase impossível não lidar com frustrações.

Eu sei qual é o paliativo que funciona: perspectiva.

Na porta da minha sala eu tenho um cartão que diz que
quando o trabalho se torna opressivo, lembre-se que você vai morrer.
Parece extremo, e é lógico que o autor escreveu o cartão com uma intenção humorística, mas a verdade é que a perspectiva que a mensagem traz é eficaz em controlar minhas frustrações no trabalho.

Perspectiva é isso: lembrar que o que é realmente importante.

Claro que trabalhar é importante e que ganhar o seu sustento trabalhando da melhor forma possível é o mínimo que se espera de um profissional.

Mas se eu for removido do trabalho, a empresa continua (como continuaram todas as que deixei por oportunidades melhores). Mudar de país não muda o que você deixou, nem o adotivo. A vida continua, com ou sem você.

Se você faltasse, o que seria realmente afetado?

Isso é importante.

O resto é resto.

11 de março de 2009

Um artigo interessante...

Li esse artigo do Joel Spolsky ainda em Janeiro. E estou desde então com ele na cabeça e sem tempo pra blogar.

O artigo é sobre como recompensar performance, psicologia, e o impacto de ambas as coisas no "bottom-line" das empresas. Vale a pena ler no original, mas eis aqui a tradução porca do google...

Eu acho que o que o Joel esquece é que, usualmente, as pessoas de melhor performance são competitivas por natureza. Não importa se elas estão costurando roupas para cachorros, produzindo código na linguagem de última geração, ou trabalhando com atendimento ao consumidor. Ignorar essa característica com "todo mundo contribui e não seria justo julgar as pessoas de forma diferente" é jogar contra o caráter mais básico das pessoas de melhor performance - alijando-os justamente do sentimento de que sua contribuição é bem recebida.

Eu concordo que a maioria das pessoas tem o hábito de se julgar mais competentes do que efetivamente são, com raras exceções. É o efeito Dunning-Kruger que já mencionei aqui de outras vezes. Todos sofremos esse efeito em algum aspecto das nossas vidas. Mas não seria o papel de um bom gerente - como o Joel Spolsky é - justamente identificar quem são os diamantes e quem são pedaços de carvão na sua equipe? E mais: manter contentes os diamantes a qualquer custo? Porque quem quer uma equipe de pessoas regulares?

Ele não discute no artigo como as pessoas respondem de formas diferentes a diferentes recompensas... Eu gostaria que ele tivesse investido um pouco nisso. Algumas pessoas só precisam ouvir um cumprimento de vez em quando, outras precisam ouvir cumprimentos o tempo inteiro; e algumas pouco se importam com cumprimentos e preferem a parte delas em progressão corporativa ou o bom e velho dinheiro vivo.


No fim das contas, em seu artigo, Joel está tentando achar uma solução de tamanho único pra um problema que tem haver com psicologia individual e observação. Ele devia estar se perguntando "O que eu poderia ter oferecido ao Noah - individualmente (se ele era realmente tão bom...) - que teria feito com que ele nos escolhesse ao invés do Google?"

A resposta poderia ser - nada! Ele escolheria o Google de qualquer maneira, ponto.

Mas que perguntas o Joel tinha de se fazer para que a resposta pudesse ser diferente?