25 de maio de 2005

Traidor ou refugiado?

Com essa novela da Globo, que minha mulher teima em assistir, eu tenho recebido vários e-mails que variam em dois temas:

a) Coitado de você e tudo que você passou aí!
b) Seu traidor, como tem coragem de abandonar o seu país!?!

O primeiro me faz rir. Porque eu vim para cá totalmente legalizado, numa condição muito melhor que muito americando nascido aqui. Visto de trabalho, salário de classe média, emprego bom, trabalho interessante, nunca fui discriminado em lugar algum... Enfim, dei sorte.

Eu sei que e vejo muito brasileiro (e outras nacionalidades também) vindo para cá para viver em condições que eu considero questionáveis - mas que eles obviamente acham aceitáveis. Diria até que melhores que no Brasil, já que vieram para cá, e ficam aqui.

Não foi meu caso, podem ficar tranquilos.

O segundo tipo de e-mail deveria me causar indignação, mas causa mesmo uma certa pena.

As pessoas no Brasil (no mundo!) hoje tem uma mentalidade anti-americanista virulenta. Não que não haja razão para ter um pé atrás com a política externa que o país sempre desenvolveu e que piorou com o Bushismo. Mas o que me espanta e o nível da "reação".

A Europa é muito pior em termos de relações comerciais com o Brasil que os EUA. Os EUA tem uma relação comercial que beneficia o Brasil que nenhum outro país tem. Nada disso conta.

Os EUA, historicamente, livraram o mundo de vários potenciais reinados sombrios. Segunda guerra mundial e o comunismo Russo são os exemplos mais gritantes. Isso também não importa.

Uma grande parte das drogas e avanços tecnológicos que beneficiam a humanidade - com um custo, claro, é o capitalismo (o único sistema que funciona) - foram inventadas ou aperfeiçoadas nos EUA. Isso é irrelevante.

E qualquer um que ouse se basear nos EUA, é obviamente um traidor biltre.

O Brasil, por outro lado, não tem problemas. É uma nação impar, que não erra. Estamos acima do bem e do mal.

Todos os países do planeta terra (e eu me aventuro a dizer de qualquer planeta onde humanos habitem) tem problemas. Cada indíviduo tem de avaliar que problemas está disposto a conviver ou qual problemas é capaz de sobreviver.

Eu decidi que prefiro viver num país onde eu discordo majoritariamente da política externa e de mais alguns resquícios de ignorância; do que num onde eu discordo de quase tudo e onde a ignorância é predominante. Prefiro conviver com a ignorância e o super-conservadorismo de alguns vizinhos, do que não ter certeza de se vou conseguir voltar pra casa vivo - apesar dos impostos pagos em dia (e caros). Prefiro falar outra língua e viver todos os dias com saudades do mar, do que falar a minha, ter o mar, e ver minha sociedade sendo lentamente dizimada pelo caos, sem nenhum tipo de reação.

Você não é obrigado a concordar comigo. Você também não tem de ler o que eu escrevo e pensar "filho da puta, incentivando os brasileiros a sair do Brasil". Você não tem de começar a planejar seu êxodo para o mês que vem. E, finalmente, você não tem de me mandar e-mails dizendo que eu sou um traidor covarde e que eu tinha de estar aí batalhando pra mudar as coisas.

Claro, você tem o direito de fazer tudo isso se quiser.

Mas, entenda, eu não "tenho" de estar num lugar onde eu sofro em nome de uma possível mudança. A mudança, que eu não acredito ser possível, não depende de uma pessoa.

Mas se você acredita nisso, torço por você! Promova as mudanças!

E me mande um e-mail dizendo que conseguiu.

Boa sorte.

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